Quem dá aos pobres, empresta a Deus
Castro Alves
Eu, que a pobreza de meus pobres cantos
Dei aos heróis-aos miseráveis grandes-,
Eu, que sou cego, -mas só peço luzes...
Que sou pequeno, - mas só fito os Andes....
Canto nest'hora, como o bardo antigo
Das priscas eras, que bem longe vão,
O grande nada dos heróis, que dormem
Do vasto pampa no funéreo chão...
Duas grandezas neste instante cruzam-se!
Duas realezas hoje aqui se abraçam!...
Uma-é um livro laureado em luzes...
Outra- uma espada, onde os lauréis se enlaçam.
Nem cora o livro de ombrear co'o sabre...
Nem cora o sabre de chamá-lo irmão...
Quando em loureiros se biparte o gládio
Do vasto pampa no funéreo chão.
E foram grandes teus heróis, ó pátria,
-Mulher fecunda, que não cria escravos -,
Que ao trom da guerra soluçaste aos filhos:
"Parti - soldados, mas voltai-me - bravos!
E qual Moema desgrenhada, altiva,
Eis tua prole, que se arroja então,
De um mar de glórias apartando as vagas
Do vasto pampa no funéreo chão.
E esses Leandros do Helesponto novo
Se resvalaram - foi no chão da história...
Se tropeçaram - foi na eternidade...
Se naufragaram-foi no mar da glória...
E hoje o que resta dos heróis gigantes?...
Aqui - os filhos que vos pedem pão...
Além - a ossada, que branqueia a lua,
Do vasto pampa no funéreo chão.
Ai! quantas vezes a criança loura
Seu pai procura pequenina e nua,
E vai, brincando co'o vetusto sabre,
Sentar-se à espera no portal da rua...
Mísera mãe, sobre teu peito aquece
Esta avezinha, que não tem mais pão!...
Seu pai descansa - fulminado cedro -
Do vasto pampa no funéreo chão.
Mas, já que as águias lá no sul tombaram
E os filhos d'águias o Poder esquece...
"'E grande, é nobre, é gigantesco, é santo!...
Lançai- a esmola, e colhereis-a prece!.
Oh! dai a esmola... que do infante lindo
Por entre os dedos da pequena mão,
Ela transborda... e vai cair nas tumbas
Do vasto pampa no funéreo chão.
Há duas cousas neste mundo santas:
-O rir do infante, -o descansar do morto..
O berço-é a barca, que encalhou na vida,
A cova -é a barca do sidéreo porto...
E vós dissestes para o berço-Avante!-
Enquanto os nautas, que ao Eterno vão,
Os ossos deixam, qual na praia as ancoras,
Do vasto pampa no funéreo chão.
É santo o laço, em qu'hoje aqui s'estreitam
De heróicos troncos-os rebentos novos-!
É que são gêmeos dos heróis os filhos,
Inda que filhos de diversos povos!
Sim! me parece que nest'hora augusta
Os mortos saltam da feral mansão...
E um "bravo!" altivo de além-mar partindo
rola do pampa do funéreo chão!
DONACIANO, A POESIA E OS DONS
Redação Didachê
"A poesia é uma fonte forte,
Inesgotável,
é a vida do poeta,
ela própria tem sua vida,
medida ou desmedida,
o poeta que a escreve
extasia seu pensar,
elaborando uma obra,
a de poetizar..."
(trecho da poesia "Poesia", do livro "Aragem na Pradaria" de Donaciano Macêdo. O texto completo está na primeira edição do Didachê).
